Um centro cultural dedicado à água, com arquitetura impressionante, cinema, museu, exposições imersivas, auditório e um bar inovador. Essa era a visão do empresário Jefferson Mello, que nomeou seu projeto de Casa das Águas.
Doze anos após o anúncio, o empreendimento ainda não foi concluído, mesmo com a captação de mais de R$ 10 milhões através de leis de incentivo à cultura. Jefferson agora é suspeito de ter utilizado os recursos públicos para contratar sua própria empresa e a firma de sua esposa para prestar serviços no local.
Atualmente, a Casa das Águas só faz jus ao nome devido às infiltrações e ao chão molhado no casarão histórico. Uma fiscalização realizada pelo deputado estadual Alan Lopes (PL) registrou e denunciou os problemas da construção situada na região da Cruz Vermelha, no Centro do Rio.
O projeto começou em 2011, quando o empresário iniciou a busca por patrocinadores. Um ano depois, ele começou a receber verbas públicas, via renúncia fiscal, para reformar e equipar o centro cultural interativo.
No total, a captação autorizada foi de R$ 10,8 milhões pela Lei de Incentivo à Cultura, que permite que empresas direcionem o valor que seria gasto com impostos para financiar projetos culturais.
Com os recursos, Jefferson não só contratou sua própria empresa, como também utilizou dinheiro público para contratar sua esposa, a chefe de cozinha Roberta Luz de Barbosa. Segundo a investigação, a primeira nota fiscal emitida pela empresa de Roberta foi para um serviço prestado para o projeto do marido.
Endereços suspeitos
A maior parte dos recursos obtidos através da lei de incentivo foi destinada ao Instituto de Sustentabilidade e Novos Talentos do Esporte e da Cultura (Intec). O responsável pelo instituto é o próprio Jefferson Mello.
Ainda em 2011, Jefferson enviou um ofício à Cedae solicitando patrocínio para a empresa. O empresário, que já foi diretor de Marketing do Botafogo, também está por trás da Jeff & Sports Marketing e Comunicação.
Essa empresa também foi contratada pelo Intec para prestar serviços no projeto do museu. Uma investigação do RJ2 revelou que a Jeff & Sports Marketing e Comunicação recebeu pelo menos 42 pagamentos nos últimos anos, totalizando mais de R$ 730 mil.
A empresa contratada pelo Intec está localizada na Rua Jardim Botânico, 674, na Zona Sul do Rio, o mesmo endereço usado como sede pela empresa contratada.
Roberta Luz de Barbosa, companheira de Jefferson, foi contratada pelo Intec para prestar serviços em outra área. O instituto pagou pelo menos R$ 760 mil à Tina Produções Artísticas por serviços de cenografia e registro videográfico, entre outros. A empresa era registrada em um endereço na Gávea, na Zona Sul, onde Jefferson já declarou morar.
Investigações
Em 2020, a Cedae já havia levantado preocupações sobre a construção da Casa das Águas. A empresa identificou possíveis irregularidades nas contratações e notificou o Intec. No ofício, relataram inconsistências no relatório de prestação de contas.
O Ministério da Cultura informou que a prestação de contas do projeto está em análise.
O que dizem os envolvidos
Em nota, a Cedae informou que o casarão pertence à companhia e que foi cedido para a construção do museu, com a contrapartida de que o imóvel fosse restaurado e transformado em centro cultural. A empresa disse que pagou R$ 3,8 milhões para o projeto e que, devido à falta de progresso, iniciou procedimentos jurídicos para retomar o casarão.
O Intec afirmou ao RJ2 que não recebeu nenhuma notificação da Cedae e que a primeira captação foi destinada à restauração emergencial do imóvel, com todos os gastos comprovados. Segundo o Intec, a segunda captação compreende o desenvolvimento de projetos executivos do centro cultural, mas não houve captação de 100% dos valores.
O Intec ressaltou que mantém o casarão com seguro, limpeza, câmeras de segurança e vigias noturnos. A reportagem questionou o fato de Jefferson Mello contratar sua própria empresa e a da esposa para prestação de serviços, mas o Intec não comentou o assunto.
Foto: Diário Carioca